quinta-feira, 14 de julho de 2011

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Alice no país das maravilhas.

"É Alice, vai continuar perdida por aí..."


"Para que serve um livro, pensou Alice, sem figuras nem diálogos?" - Alice no país das maravilhas...

Esta é a personagem de Lewis Carroll, no auge da sua infância, nos dando uma amostra de sua visão imatura sobre literatura.
Crescimento é uma das temáticas abordadas por Carroll na sua obra, que é rica pela possibilidades de leituras que ofereceu e continua oferecendo até hoje, mostrando que a arte, para se tornar memorável sempre, deve ter potencial para se reinventar a todo instante. Então o que no século XIX era uma crítica à sociedade vitoriana, podia ser também um conto sobre os conflitos de uma criança em crescimento, um ensaio sobre problemas de lógica. Alice inaugura uma nova sutileza em histórias infantis que não são exclusivas do público infantil.
De fora alguma Tim Burton poderia ter transposto de forma mais acertada Alice para a realidade do nosso período. Com assombroso apuro técnico, ele nos mostra como a compreensão atual está baseada na unidimensionalidade, na satisfação rápida, no fast food visual que dá satisfação momentânea a quem vê e vai embora sem deixar nenhum rastro, ou espaço para uma segunda interpretação.

O país das maravilhas era uma metáfora ao paraíso, um local sem regras muito claras. Tim burton dirigiu a burocracia chegando à essa terra, em que Alice segue um roteiro padrão de qualquer filme de fantasia para alcançar o prêmio final, a maturidade, após enfrentar seu dragão, quando Carroll quer mostrar que o Dragão não existe realmente.

De onde vêm a autoridade da Rainha Vermelha? Porque as coisas são desse jeito, e não de outro? Porque me levantar e colocar chá na minha xícara, se posso colocar xícaras cheias em todos os assentos?
"Minha xícara está vazia, passo para outro banco."
Carroll por diversos artifícios mostra que crescer para o mundo nada mais é que desvendar seu funcionamento, o porque das coisas, o que nos dá a possibilidade de intervir. Ao contrário do que a Disney leva a crer, crescer tem muito pouco a ver com fatalidade, espadas mágicas e destinos escritos.
Mas voltemos para a pergunta inocente da personagem infantil Alice, perdida entre questões tão intrigantes quanto o destino da humanidade é para os filósofos.
"Para que serve um livro, pensou Alice, sem figuras nem diálogos?"
Não fique aborrecida Alice, caso não encontre a resposta, pois a sociedade de dois séculos depois de Lewis Carrol ainda fica intrigada com questões como estas: " de que serve um filme infantil com ação, aventura, suntuosidade vazias?"

sexta-feira, 11 de março de 2011

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Páprika - Sua mente num Anime

Pesquisando sobre o diretor Darren Aronosfky, descobri o também diretor Satoshi Kon, e a casa de animação Madhouse. O estúdio carrega no currículo a criação e produção de séries como Devil May Cry, Sakura Card Captor, Death Note e as versões nipônicas de Wolverine e Supernatural (no Brasil, Sobrenatural).
Já Satoshi Kon (1963 - 2010) é influência assumida de diversos diretores americanos que hoje brilham no circuito, e tem como temática de seus filmes a confusão entre realidade e fantasia, abusando da psicologia para dar corpo à suas estórias.
Esse é o caso de Páprika (2006), uma ficção científica de primeiríssima, animada com tanta competência que bate de frente em qualidade com as obras do estúdio Ghibli. No filme, uma técnica revolucionária de psicoterapia é criada, chamada terapia do sonho. O tratamento consiste no uso de um aparelho, o DC Mini, capaz de permitir que sonhos sejam compartilhados, assistidos em monitores por outras pessoas, e também gravados.


Contudo o mundo dos sonhos se revela um lugar extremamente perigoso, à medida em que várias pessoas compartilham o mesmo sonho e interferem nele. A doutora Atsuko Chiba então cria um alterego com intenção de guiar os médicos, a garota Páprika.

O arco dramático da coisa é que ocorre o roubo de três aparelhos, e a partir daí vários médicos envolvidos no projeto tem seus sonhos invadidos, e são aprisionados dentro de um sonho que eles não controlam. Cabe à Atsuko Chiba, e Páprika descobrir quem está por trás do roubo e qual a intenção do ladrão com o sequestro nos sonhos.
A estória não só parece complexa, ela realmente é. Resumir foi uma tortura. Mas na tela funciona incrivelmente bem pois a animação fluida, as cenas assustadoras, e o roteiro consistente nos faz acreditar no que vemos, paradoxalmente nos fazendo sentir uma estranheza que incomoda e gruda nossos olhos na tela.


Os pontos negativos residem em algumas cenas que realmente só foram colocadas para fazer o filme parecer mais complexo do que é, dando um ar de arrogância à coisa.
Definitivamente não é para crianças, visto que temos uma cena de estupro, ainda que surreal e uma história difícil, mas que recompensa enormemente o espectador com uma salada de sensações boas e más.


Ótimo ( * * * *)
Curiosidades
Christopher Nolan (Batman - O Caveleiro das Trevas) disse publicamente que Páprika foi uma inspiração importante para sua ficção A Origem (Inception), indicada a vários Oscars, inclusive melhor roteiro original. Então toda a semelhança entre os filmes só revelam que o Nolan é admirador do diretor japonês.

Darren Aronosfky é fã confesso do Satoshi Kon, sendo que o nome Nina, a bailarina de Cisne Negro, é inspirada em Mima, uma personagem de Perfect Blue.

Os filmes que aparecem nos cartazes no cinema mostrado em Paprika são todos do mesmo diretor do anime. As obras são Tokyo Godfathers, Perfect Blue.

sábado, 5 de março de 2011

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O túmulo dos vagalumes



Até entendo as pessoas que dizem não ter afinidade com animações, talvez porque a maioria do que se vê tem estórias piegas, rasas como um píres, com bonequinhos ultra coloridos... Melhor parar por aqui. Se este é o seu caso, o filme "o túmulo dos vagalumes" (1988), tem grandes capacidades de quebrar essa péssima impressão. Oferecendo o que de melhor a animação pode oferecer, essa pérola do Estúdio japonês Ghibli, internacionalmente famoso pelo "A Viagem de Chiriro", é ainda um grande drama e uma interpretação metafórica sobre o próprio Japão em plena Segunda Guerra mundial.

Baseado no livro de Akiyuki Nosaka, o filme narra a trajetória do adolescente Seita e sua irmãzinha Satsuko, mostrando a transformação radical de suas vidas devido à chegada da guerra ao Japão. Quando pedaços de madeira em chamas caem do céu incendiando sua cidade natal, as duas personagens perdem a mãe para o fogo e passam a viver com a Tia num lugarejo em tensão constante causada pela expectativa de um ataque semelhante. Lá, convivendo com cobranças da Tia, a escassez de comida e a humilhação, os dois fogem e se abrigam numa pequena caverna, onde as carências materiais só são diminuídas pelo amor que nutrem um pelo outro.

O roteiro da obra é extremamente competente por fazer o espectador comprender a importância do orgulho, um valor muito caro aos ocidentais, tornando a necessidade da fuga um ato de coragem e libertação ao que poderia parecer a uma cabeça quadrada uma demonstração de estupidez. Mas essa é apenas uma façanha. Algumas cenas simples, mas poderosas, como a dos vagalumes, que dão título ao filme, entraram para a História do cinema por seu lirismo e, a condução de uma história cujo final trágico desde o começo já nos é apresentado nos faz assistir a cada cena ávidos por compreender o que ocorreu com os irmãos. O nível das animações é acima da média, ou seja, é um prazer ver o esmero para tornar a imagem fluida como num filme live action.


Para mim, o melhor fica mesmo por conta da analogia dos jovens com o Japão em guerra, percebendo em seu sofrimento e humilhação a imagem de um país que vê de um momento para o outro valores milenares reduzidos à nada. Cujo maior peso para continuar caminhando é carregar na mente a imagem dos corpos dos entes queridos, e repensa tudo isso enquanto, na modernidade, os descendentes dormem livres do trauma dessas experiências.


Excelente (* * * * *)

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

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Capote (Capote) e Confidencial (Infamous): um exercício cinematográfico.

Duas cinebiografias sobre o mesmo escritor norte americano, Truman Capote, cobrindo um mesmo período da vida deste, o processo de pesquisa para escrever o que se tornaria uma das grandes obras da literatura americana, “A sangue frio” resultam em algo curioso: obras nitidamente diferentes e inteligentes.
Antes a sinopse. Em 1956, o escritor famoso por obras como Bonequinha de Luxo, Truman Capote, lê um artigo num jornal sobre um assassinato brutal de uma família duma pequena cidade do Kansas. Instigado, ele segue para lá no intuito de escrever sobre o estado de desconforto da população local, uma vez que qualquer um poderia ser suspeito do crime. Só que seus planos são mudados pela descoberta dos assassinos, e seu relacionamento com um deles.
O primeiro, Capote, dirigido por Bennett Miller, não possui grandes ou muito famosos rostos mas um elenco eficiente, fotografia risível em alguns momentos (muitos planos abertos de paisagens com duas árvores fazem você questionar o bom gosto do diretor de fotografia), roteiro afiado e direção segura, tem seu brilho na atuação de Philip Seymour Hoffman.
Com uma atenção perfeccionista às minúcias de cada movimento da sua caracterização (perceba, por exemplo, a execução de gestos no pequeno desfile para sua amiga Nelle Harper Lee na saída do hotel), a atenção à voz do afetado autor conhecido por ter o timbre igual ao de um repolho de Bruxelas se este falasse, perfeitamente simulada. Este filme desperta uma vontade irresistível de procurar mais filmes com o ator, tamanha a desenvoltura do Hoffman. Adianto que quem optar por fazer isto assistirá obras muito boas, como Boogie Nights, Magnólia, Mary e Max, entre outros.
O roteiro é igualmente ótimo pelos diálogos inspirados, nos quais fica explícito a personalidade corrosiva de Capote, oferecendo a possibilidade para o estudo de personagem: Capote era irônico, sarcástico, manipulador, depressivo. Ao decorrer da sua pesquisa numa pequena cidade do Kansas, vai se enredando por essa realidade diferente (existe realmente um choque cultural entre o escritor acostumado às altas rodas da sociedade na cidade grande e a população do interior) e tem um affair com um dos assassinos, Perry (Clifton Collins Jr.).
Aproximando-se do homicida com clara intenção de sugar informações, Capote ajuda Perry e seu comparsa com advogados e visitas, mas o relacionamento entre os dois ultrapassa o limite do utilitarismo, criando uma confusão afetiva no autor (e contornos mais interessantes à trama). Contudo, todo esse relacionamento é tratado com insinuações, de forma mais abstrata, numa abordagem semelhante à de Philadelphia (1999), e assim o filme tende mais ao politicamente correto.
Confidencial, por ser um filme independente (mas recheado de rostos conhecidos, inclusive Sandra Bullock numa atuação ótima como Nelle), é mais ousado em vários aspectos. A começar, o próprio Capote na interpretação de Toby Jones (ótimo como Hoffman) aqui é mais afetado e mais sensacionalista. Numa cena específica, é mostrado como seu Capote testava diversas frases em seus diálogos e escolhia para o livro aquela que tivesse causado mais impacto no ouvinte.
A relação com o homicida nas visitas à cela também são menos pudicas e mais passionais, atestando também o talento de Craigh no papel do assassino. O maior trunfo aqui também é o roteiro, mais intimista, entrecortando a narrativa dos episódios com depoimentos diversos sobre o autor que vão desde a sua personalidade ímpar até sua relação com os pais, numa abordagem psicológica para explicar o jeito de ser da personagem. De infância pobre e sem carinho dos pais, Capote e Collins Jr. aqui parecem irmãos de almas gêmeas, separados pelas oportunidades. No geral, é esta abordagem menos cast(rada)a que diferencia e torna o filme interessante de ver e comparar. No final, o que temos é isso: duas obras que parecem se repelir e se completar, e são obrigatórias para os fãs de cinebiografias ou aqueles que simplesmente apreciam bons filmes.
* * * * (ótimo)

terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

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Cisne Negro: uma experiência arrebatadora do início ao fim


Comecei a assistir Cisne Negro com uma certa expectativa, pois simpatizo com o estilo de direção de Darren Aronofsky desde que vi o famigerado Requiem para um Sonho, tenho certo fascínio pelo Lago dos Cisnes, pelo conto em si, e pela abordagem psicológica prometida pela sinopse. Mas Aronofsky foi além, entregando um filme conciso, que aborda questões como a dedicação artística e a sexualidade com ousadia e verdade, além de nos brindar com um final dramático tão triunfante, ainda que clichê, que me faz concordar com a pretenciosa frase final que encerra a projeção: “Foi Perfeito”.

A sequência inicial nos apresenta à personagem Nina, numa interpretação bravura de Natalie Portman, dançando o que será um de seus dilemas por todo o filme, o Lago dos Cisnes, precisamente a maldição sobre Odette, que se transforma em cisne. O equivalente na vida real de Nina é o fato de conseguir ser escolhida para o papel da Rainha dos Cisnes numa remontagem do clássico de Tchaikovsky. Agora presa artisticamente pelo compromisso, e só entende a submissão do artista com a arte e suas implicações dolorosas aquele que não é mero consumidor, ela fará tudo para superar seu maior entrave: sua personalidade, seu próprio eu.

Acontece que Nina tem todas as características do Cisne Branco, a pureza, inocência e apego as regras que ela reflete em sua dança tecnicamente perfeita, mas não convence como Cisne Negro, personagem malicioso, passional. A tentativa de se moldar como Cisne Negro através da batalha com elementos reprimidos de sua personalidade, como a sexualidade, e as consequências disso completam os dilemas que guiam o filme.

A construção psicológica do argumento enriquece a história através da personagem controladora mãe de Nina (Barbara Hershey), uma bailarina que abandona a profissão devido à gravidez. Esta infantiliza a filha destruindo sua privacidade, como quando não permite que a filha se tranque no quarto, ou mantendo uma decoração de bonecos e pelúcias no quarto. Por outro lado, o diretor do ballet, interpretado por Vincent Cassel, tenta extrair de forma violenta a sexualidade de Nina, induzindo-a a buscar em aventuras sexuais a libido que falta para melhorar sua dança. Vale citar também o pequeno (e apropriado) papel dado a Winona Ryder, que também convence como a bailarina aposentada pela idade, substituída por Portman.

O jogo de espelhos, as duplicatas vestidas de negro que a sempre santa Nina enxerga à sua espreita são recursos empregados com inteligência, sem cair no clichê. A versátil câmera de Matthew Libatique dá ora um tom de documentário, para dar veracidade, outra dança acompanhando os bailarinos na auto destruição de Nina. Os efeitos sonoros e a trilha, baseada na peça, ajudam a criar o clima de suspense que permeia a aflição e as alucinações de Nina. Mas o contraponto essencial está na personagem de Mila Kunis, a Lily.

Um cisne negro perfeito, maledicente e luxuriosa, Lily se torna para Nina uma obsessão, tanto como fonte de inspiração quanto como adversária na dança, uma vez que a paranoia a faz ter certeza que Lily deseja lhe roubar o papel. Enfrentando uma Lily idealizada na sua mente, Nina enfrenta apenas os próprios tabus, o que rende também cenas picantes como a bem executada transa entre as personagens.

O final é emblemático, e obviamente não contarei aqui. A conclusão da obra é impactante, tem a interpretação mais visceral de Natalie Portman, e vai arrancar um sorriso de satisfação daqueles que realmente gostam do cinema-arte, mas posso adiantar que o simbolismo nunca teve utilidade tão prática. E tão brilhante.

* * * * * (cinco estrelas)

Meu favorito ao Oscar desse ano, concorrendo a melhor filme, diretor, atriz, edição e fotografia.


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